segunda-feira, 10 de maio de 2010

A minha primeira Entrevista

Depois de muito reflectir resolvi ganhar coragem para publicar aqui a minha entrevista. Uma partilha intima e profunda, cá vai:

P- Sente-se uma vencida ou uma vencedora?
R- vencedora. Vencedora, porque ao longo da minha vida vivi obstáculos e etapas, momentos difíceis, mas tento sair deles sempre a sorrir e sempre de bem com a vida. Todo o esforço que eu fiz ate hoje, sinto que hoje, aos 21 anos, fui muito recompensada, principalmente com a ajuda da família, amigos, fisioterapeutas, este nomeadamente. E que apesar desses momentos difíceis eu sinto-me bem com a vida, não tenho nenhum constrangimento, porque estou estável. Estou bem.

P- Qual a sua reacção perante um vencido, uma vez que deseja ser psicóloga, psicoterapeuta?
R- Exactamente mostrar-lhe que há outra maneira de ser feliz, que não o andar. Há outras maneiras de ser independente, há outras maneiras de ter vida própria, para além de…
Tenho vontade de a fazer sorrir e ver outros lados da vida.
P- Quando teve a noção que tinha a doença, qual foi a mudança, o impacto na sua vida?
A minha doença já é desde nascença, por falta de oxigénio durante o parto. E é evidente que quando uma pessoa é pequena não se apercebe, porque os pais sempre me mostraram que não, principalmente os meus, que não tenho nada, e comparado com outras pessoas não tenho nada mesmo. Mas é paralisia cerebral e eu realmente sempre soube que não ia andar. Eu lembro-me de uma vez que era pequena, de ter umas fotografias comigo em pé e virar-me hoje em dia, para os meus pais, e dizer “ah eu já andei”. Ou seja, ás vezes tenho sonhos ou fases da vida que penso que isso já aconteceu, quando não aconteceu. Eu sei perfeitamente que não aconteceu. Sei perfeitamente como foi o meu parto, sei que é uma paralisia cerebral de nascença. Sei tudo, mas as vezes passa-me pela cabeça que não e que poderá ter acontecido.
Eu nunca vivi o outro lado da vida, não sei o que é o outro lado da vida. Por isso… andar é um sonho, é um sonho pelo qual lutarei toda a minha vida, aliás é o meu grande objectivo de vida, mas também não é aquela frustração total, porque eu nunca experimentei. Eu experimentei um outro lado da vida, sem andar como se pode ser feliz.

P- Quais foram as principais barreiras que encontrou na sua vida?
R- É assim, este pais ao nível de barreiras arquitectónicas é uma porcaria. Não há mesmo condições para poder sair à rua sozinha. Comprei agora uma cadeira de rodas eléctrica a achar que já sou a pessoa mais independente do mundo, e sou (!), eu realmente vou aos sítios onde quero ir, mas tem que haver algum problemazinho para eu não poder chegar ao sítio.
Encontramos [degraus] em centros de fisioterapia, em consultórios de psicologia, o que eu acho ridículo. O meu consultório de psicologia tinha 3 degraus, onde é que já se viu 3 degraus para uma cadeira de rodas. Num consultório medico, onde devia ter o máximo de condições.
Barreiras arquitectónicas, se for a baixa do porto é horrível, o piso é horrível. A casa da música não sei se tem acessos. Eu já lá fui, mas também nunca acedi à casa da música toda. Como a casa da música, imensos museus não têm. Não é só Portugal, também são outros sítios.

P- A nível social sentiu obstáculos?
A nível social, sempre tive uma integração o máximo normal possível, sempre andei em escolas normalíssimas, nomeadamente a Garcia, que é uma escola pública. Nunca encontrei nenhum tipo de má receptividade por parte de amigos. Sempre tive aulas normalíssimas, nunca tive, posso dizer que quase nunca tive ensino especial. Andei em escolas sempre publicas, só agora é que ‘estou na faculdade privada. Mas não é por nada, é porque tem sucesso e eu resolvi investir numa coisa que gosto.
A nível de amizades, penso que é isso que querem saber. Sou a pessoa, neste momento, mais realizada a nível de relações. Tanto amistosas, como de tudo. Já tive más fases, na escola primária era difícil, eram complicadas, mas agora fui crescendo e as mentalidades com que me cruzo também são mais desenvolvidas, mais maduras. Por isso as pessoas percebem os sentimentos dos outros, o nosso outro lado da vida e por isso, é mais fácil para mim construir relações. O meu grupo de amigos é espectacular, gosto muito deles mesmo e sinto que se eu precisar posso contar com eles sempre.
A nível familiar… [silencio] O meu pai sempre foi super e a minha mãe também sempre foi super afectiva, super… tentou sempre normalizar a situação. Mas sim, é verdade, ao início existia ali um esconderijo por parte de algumas pessoas, mas sei lá, á medida que vamos crescendo vamos tentando que isso não seja permitido. Não posso permitir tal coisa. Sempre segui as minhas escolhas como quis, estou no curso que quero, fui para onde quis. Faço tudo o que quero, entre aspas…não há nenhum impedimento para eu seguir os meus sonhos.

P- Qual a sua relação consigo própria?
R- Neste momento? Pergunta complicada…
É assim tive, ao longo da minha vida, nomeadamente aos 17 anos, uma má fase, mas sinto que estou melhor, entretanto fui seguida por um médico. Um bom psicólogo que está mesmo especializado em pessoas com problemas, ainda hoje estou a ser seguida por ele… só por motivos de descarga de consciência. Ter ali alguém para que a qualquer momento me possa apoiar. De momento não tenho assim nenhum conflito existencial.
Em pequena, e ainda agora, já tive muitos sonhos a meio da noite de acordar e achar que estava a andar… mas isso já foi à um ano atrás. E às vezes acontece, acordo, acendo a luz e penso “ai não, afinal foi só um sonho. Vou mas é dormir”. Isso mexe comigo, como é claro. Acordar e sentir que não é nada verdade, que estou a alucinar. Claro que estou a alucinar, porque isso não acontece de um dia para o outro. Não é que não vá acontecer… talvez um dia aconteça, mas não é na cama que vai acontecer. Também já chorei que chegue. Já os tive, neste momento não sinto conflitos. Conflitos de “Quem sou eu” , “Porquê eu?”.Todos os têm!
P- Qual a sua fonte motivação para a luta?
R- [suspiro] Os amigos!
O que me faz continuar aqui? Primeiro, tenho objectivos de vida e tenho de lutar por eles… se tenho de lutar por eles tenho de enfrentar as pessoas de bem com a vida e sentir que sim, que sou capaz.
Eu não sabia se era capaz de dar esta entrevista, foi difícil para mim aceitar, mas sentir que além de ser bom para mim e para o meu curso era bom para eu crescer e me habituar…não vai ser a ultima espero eu.
Sentir que cada vitória e cada passo, porque eu já dei um passo sozinha, é festejado como se fosse um acto único e heróico… tê-los todos lá para mim é maravilhoso…

P- Qual o seu lema de vida?
R- Viver o momento como se fosse único.
Eu vivo esses momentos de vitória como senão fossem existir mais, porque eu não sei quando eles vão existir.

P- Quais as suas previsões para o futuro?
Tirar curso de psicologia e andar…

P- Acha que para existir menos discriminação a sociedade deve estar mais informada ou as pessoas diferentes devem ter uma posição mais activa?
Há pessoas que andam prai a reclamar que não há condições. Realmente há muitas barreiras arquitectónicas… mas eles assumem isso e não saem de casa, não reclamam…
Se os deficientes não vão para um sítio onde tem escadas, como podem reclamar?
Por exemplo se num restaurante existem escadas e não vai lá ninguém com necessidades especiais, o dono não vai colocar uma rampa… é dinheiro que gastam….

P- Como aceita um não relacionado com a sua condição?
R- Não aceito, é inconcebível… Não é não consigo, é ainda não consigo, porque o futuro ninguém sabe…. Também depende do que a gente dá por isso, e do que me pedirem. Sei muito bem que não vou conseguir vencer a maratona, a não ser a maratona de cadeira de rodas…
Mas o resto, é o que eu digo nunca fui impedida de fazer nada.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Um simples jantar

Pois é, dei a minha primeira entrevista no mês passado. Uma entrevista a pedido de umas alunas do primeiro ano de Psicologia que estavam a fazer um trabalho sobre doenças neurológicas e queriam falar com uma pessoa que fosse um exemplo de sucesso na vida.
Ora, eu soube disso através do meu fisioterapeuta que mal as raparigas apareceram no ginásio dele, se lembrou de mim. No entanto, não me disse nada. Pura e simplesmente combinou com as raparigas um dia e elas passaram por lá para me conhecer.
Demorei um pouco a aceitar pois tive um certo medo das perguntas a que iria estar sujeita, mas sim! Aceitei e na semana seguinte lá estava eu nervosissima mas pronta e receptiva a quaisquer questões.
Digo - vos que as perguntas não eram nada simples. Tive que recordar muitas experiências anteriormente passadas, dai ter sido bastante duro. Mas mais uma vez me superei a mim mesma e ás minhas expectativas em relação áquela "prova".
Mais uma etapa da minha vida vencida com todo o sucesso e empenho, pois expor - me á sociedade sempre foi algo que eu queria fazer mas não me sentia preparada psicologicamente.
O balanço foi extramamente positivo. É que depois consegui juntar meia dúzia de amigos e falar abertamente sobre mim. Vi um empenho muito grande da parte deles ao terem vindo cá partilhar este momento de reflexão Senti que sim, que realmente tenho um grupo de amigos fantásticos com os quais posso sempre contar. Esta reunião foi a prova disso mesmo!

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Dia Mundial do Cidadão com deficiência

Hoje é o dia Mundial do Cidadão com Deficiência! Odeio estes dias. Quer dizer, existe mais de um milhão de deficientes em Portugal e só hoje, só neste dia que eles existem. Por amor de Deus. Estamos a falar de uma grande porção de população que fica literalmente esquecida, posta para segundo, para não dizer quinquagesimo plano. Mas que é isto??
É só neste dia é que se lembram que se tem de fazer alguma coisa para mudar este nosso País?Pior esta nossa misera cidade que é pró em barreiras arquitectónicas...Que tristeza
Esta sociedade pensa que é á custa de um outro programa televisivo a dar uma vez por ano que algo vai mudar e então hoje, unica e exclusivamente hoje resolvem abordar o tema da deficiência...mas com muito cuidado porque pode ferir mentalidades, susceptibilidades....
Estas e outras questões são as que uma cidadã com deficiência como eu, e tantos outros com os mais diversos handicaps se deparam todos os dias no seu quotidiano, não é hoje. são todos os dias.....
Não é com dias mundiais que vamos mudar algo pois 24h por ano não chegam para nada, não servem de nada. Sim, porque amanhã já é outro dia que não o do cidadão com deficiência por isso já nada se faz. Já ninguèm se lembra que este país está um caos, já ninguém se lembra que a diferença existe e que se tem de lutar pela igualdade de direitos e oportunidades.

domingo, 30 de agosto de 2009

Devaneios

Passei muito tempo sem escrever porque não tenho tido muita inspiração...Será que já não sai nada de jeito?? A falta de hábito e prática dá nestas coisas, não é verdade?
Pois agora chegou a altura de pensar por mim, deixar - me levar por aquilo que realmente me faz feliz. Sempre quis ser uma pessoa independente e agora, após vinte anos resolvi tratar disso: ter vida própria, viver por mim e desprender - me, aos poucos dos meus pais.
Esta sensação de autonomia, de liberdade é muito estimulante. Retirou a monotonia dos dias, a rotina do costume. Aos poucos vou - me sentindo cidadã do mundo, vou dando voz á minha consciência e libertando a angústia que há em mim. Ao me sentir assim, vou conquistando pequenas coisas pelo facto de me fazer ouvir como pessoaa. Porque "a falar é que a gente se entende"

domingo, 10 de maio de 2009

9 de Maio de 2009

O titulo corresponde a um dia que vai ficar para sempre marcado dentro de mim.
No sábado fui passar o dia a uma iniciativa chamada AJUTEC - feira de ajudas tecnicas na Exponor.
Esta feira acontece ano sim, ano não no Porto durante três a quatro dias no máximo. E eu nunca tinha ido. Este ano fui e adorei. Adorei não só pela diversidade de apoios e ajudas que lá encontrei a nivel tecnológico, como também a nivel humano
Pronto, vi montes de cadeiras eléctricas de todos os géneros e feitios. Diversos apois e mobilia adaptada muito interessante e bonita. Estou a realçar a beleza porque é muito raro encontrar - se móveis que conseguem conjugar a utilidade com a estética. Isto já para não dizer que mal lá cheguei deixei a minha cadeira de lado e percorri a feira de cadeira eléctrica!!!
Ou sej, senti - me a mulher mais livre e independente do mundo. É preciso estar a par das novas tecnologias e irmos - nos actualizando ao máximo. Tão excelente sensação estará a chegar dentro de semanas!
Mas para além disso, este dia foi muito marcante porque consegui conhecer o significado de igualdade, igualdade de circunstâncias, igualdade de dificuldades.
Este lado do mundo e de pessoas sempre foi um pouco vedado na minha vida. Por isso é que ás vezes me sinto um tanto ou quanto inibida quando me deparo com os mais diversos handicaps. Mas desta vez não. Foi com toda a naturalidade que conheci novas pessoas, partilhei experiências e me senti lindamente. Senti - me igual. Adquiri novos contactos e novas amizades. Venham mais e mais oportunidades que eu estarei lá sempre!
"Todos diferentes, todos iguais" Pensem nisto!

quinta-feira, 26 de março de 2009

Decisões, para que??

Quando era mais nova era tudo tão simples, tao fantástico. Achava que tudo tinha uma solução rápida e prática. Tinha quem decidisse por mim. Será bom ou mau?
Boa pergunta, ás vezes eu fico tão confusa que o meu maior desejo é pedir alguém que decida, que me tire aquela missão tão grande que é a tomada de decisão.
No entanto, sei que chegou a altura de ser eu a tomar conta de mim, altura de seguir um caminho diferente daquele que muita gente está a espera. Independência é a palavra de ordem neste momento da minha vida. Porque embora possa não parecer vinte anos é muito já. É tempo de seguir um novo rumo, em frente sempre! Mas a viver bem e feliz que é isso que toda a gente procura...e isso faz - se ao longo deste caminho ingreme e duro que é a nossa existência!

segunda-feira, 2 de março de 2009

És feliz?

Esta pergunta não assim tão linear como se pensa, ou seja o conceito de felicidade, para mim, é muito relativo e dificil. Porque a vida é composta por momentos e pessoas que nos fazem felizes, que nos fazem sentir bem.
A felicidade é isso mesmo, saber retirar partido de pequenas coisas, essas coisas minimas que nos fazem seguir o nosso caminho em frente. Ora, eu posso dizer que tenho momentos muito felizes, que vivo rodeada de pessoas maravilhosas e que me fazem ver que a vida pode "sorrir". É como tudo, temos fases boas e más, nomentos alegres e tristes.
No entanto, nós quando algo nos corre mal, quando a vida não nos consegue "sorrir" é porque algo está mal em nós. Dai devemos conseguir tirar lições e ver que erramos, só assim conseguiremos melhorar o nosso "eu"
Para mim, ser feliz é conseguir afirmar - me como pessoa e essa afirmação ser reconhecida pelos outros. É este o ciclo de vida: fazermos coisas que nos agradem e que depois sejam vividas pelos outros e reconhecido o seu valor, é atingir os objectivos a que nos propomos. Sem objectivos não há vida, há vazio!